Fonte: STJ 

Por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, na discussão sobre a impenhorabilidade de pequena propriedade rural, o ônus de comprovar que as terras são trabalhadas pela família recai sobre o executado, dono do imóvel.

Além disso, para o colegiado, o fato de os devedores serem proprietários de outros imóveis não impede o reconhecimento da impenhorabilidade, desde que os terrenos sejam contínuos e a soma das áreas não ultrapasse quatro módulos fiscais.

Com base nesse entendimento, os ministros determinaram o retorno de um processo ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) para que, em novo julgamento, avalie se o imóvel é ou não penhorável.

Na execução de uma dívida contra o produtor rural, a impugnação à penhora foi rejeitada sob o fundamento de falta de prova de que a propriedade seja trabalhada pela família ou lhe sirva de moradia. O juízo também considerou inviável o acolhimento da tese de impenhorabilidade, pois os devedores são proprietários de outros imóveis. O TJMG negou provimento ao recurso dos proprietários sob o argumento de que eles não comprovaram os requisitos da impenhorabilidade.

No recurso ao STJ, os devedores argumentaram que o imóvel penhorado tem área inferior a quatro módulos fiscais e que a soma dos demais terrenos que possuem está compreendida nesse limite legal.

Lacuna legislativa

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, para reconhecer a impenhorabilidade, como preceitua o artigo 833, VIII, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), é preciso que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e que seja explorado pela família.

Entretanto, segundo a ministra, não há uma lei definindo o que seja pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Ela explicou que, diante da lacuna legislativa, a jurisprudência tem tomado emprestado o conceito estabelecido na Lei 8.629/1993, que enquadra como pequeno o imóvel rural “de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento”.

Como lembrou a relatora, a Terceira Turma já considerava, na vigência do CPC/1973, que o reconhecimento da impenhorabilidade exigia do devedor a comprovação de que a propriedade é pequena e se destina à exploração familiar (REsp 492.934 e REsp 177.641). E a regra geral prevista no artigo 373 do CPC/2015 – acrescentou a magistrada – estabelece que o ônus de demonstrar a veracidade do fato é da parte que o alega.

Para a magistrada, a legislação é expressa ao condicionar o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural à sua exploração familiar.

“Isentar o devedor de comprovar a efetiva satisfação desse requisito legal e transferir a prova negativa ao credor importaria em desconsiderar o propósito que orientou a criação dessa norma, o qual consiste em assegurar os meios para a manutenção da subsistência do executado e de sua família”, afirmou.

Proteção constitucional

Nancy Andrighi destacou também que ser proprietário de um único imóvel rural não é pressuposto para o reconhecimento da impenhorabilidade. “A imposição dessa condição, enquanto não prevista em lei, é incompatível com o viés protetivo que norteia o artigo 5º, XXVI, da Constituição Federal e o artigo 833, VIII, do CPC/2015”, completou.

Segundo ela, se os terrenos forem contínuos e a soma de suas áreas não ultrapassar quatro módulos fiscais, a pequena propriedade rural será impenhorável. Caso a área total seja maior, a proteção se limitará a quatro módulos fiscais (REsp 819.322).

Por outro lado – comentou a ministra –, se o devedor for titular de mais de um imóvel rural, não contínuos, mas todos explorados pela família e de até quatro módulos fiscais, a solução mais adequada é proteger uma das propriedades e autorizar que as demais sejam penhoradas para a quitação da dívida, como forma de viabilizar a continuidade do trabalho do pequeno produtor e, simultaneamente, não embaraçar a efetividade da Justiça.

Especificidades

No caso analisado, a relatora entendeu que o fato de o imóvel ser explorado pela família é incontroverso, mas o TJMG não verificou se os outros terrenos dos devedores são contínuos e se também são trabalhados pela família; por isso, o processo foi devolvido para novo julgamento.

Ao dar provimento parcial ao recurso dos devedores, a ministra observou que, a partir da análise das especificidades do caso, o julgador poderá autorizar a substituição do bem penhorado por outro igualmente eficaz e menos oneroso para o executado, em observância ao princípio da menor onerosidade da execução.