Fonte: STJ

Com a instituição do trabalho remoto e a crescente digitalização dos processos judiciais, o Poder Judiciário ganhou maior eficiência e celeridade. Graças a esse combo, o ano de 2021 foi permeado por importantes julgamentos no âmbito do Direito Administrativo, tanto em questões atinentes ao Direito processual que afetam a prática dos especialistas da área quanto ao Direito material propriamente dito.

Logo no início do ano, o Supremo Tribunal Federal julgou a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.534, que impugnava o artigo 535, §3º, inciso II, e §4º, do Código de Processo Civil (CPC) no que diz respeito ao prazo para pagamento de requisições de pequeno valor (RPV) e à definição do regime de pagamento de valores incontroversos.

A Suprema Corte entendeu, por maioria, que os estados não podem dispor livremente sobre esse prazo. Todos os entes federativos devem seguir a regra de não ultrapassar dois meses para pagamento, contados desde a requisição. Quanto aos incontroversos, estes devem observar o valor total da condenação. Se houver impugnação parcial da execução ou do cumprimento de sentença, o valor incontroverso poderá já ser requisitado, desde que obedeça ao regime de pagamento correspondente ao valor integral discutido nos autos.

Em março, o Superior Tribunal de Justiça concluiu julgamento de alta relevância para servidores públicos, acerca da necessidade de reposição de valores ao erário. No julgamento do Tema Repetitivo nº 1.009, o STJ definiu que quando o servidor recebe valores indevidos decorrentes de erro operacional do órgão, ele deverá restituir o montante à Administração Pública.

A relevância reside no discrímen com relação ao Tema Repetitivo nº 531, em que o STJ havia firmado a tese de que valores recebidos devido à interpretação equivocada da lei pela Administração Pública não estão sujeitos à devolução. Nesse caso, a boa-fé do servidor é presumida, pois o descuido na aplicação da lei acaba por criar uma falsa expectativa de legalidade desses valores, de modo que os servidores não merecem arcar com o erro.

Já no caso de mero equívoco procedimental do órgão, a Corte Superior entendeu que não existe essa presunção. Ainda assim, fixou a possibilidade de aferição da boa-fé caso a caso. Se o servidor demonstrar que não lhe era possível constatar o pagamento indevido, poderá ser isento da devolução.

Na metade do ano, outro julgado ganhou destaque no Supremo. Com o julgamento da ADI nº 4.296, deixou de subsistir o argumento mais comum utilizado por magistrados para negar pedidos de liminares em demandas judiciais de servidores públicos: o conhecido artigo 7º, §2º, da Lei nº 12.016/2009, a Lei do Mandado de Segurança.

Ao declarar a inconstitucionalidade do dispositivo, o STF permitiu a concessão de liminares que importem aumento ou extensão de vantagem ao servidor. Nesse mesmo julgamento, também foi considerada inconstitucional a exigência de oitiva prévia do representante da pessoa jurídica de direito público como condição para a concessão de liminar em mandado de segurança coletivo.

Em setembro, o STJ julgou o Tema Repetitivo nº 1.089, em que se discutia a viabilidade de dar prosseguimento à ação civil pública por ato de improbidade administrativa para ressarcimento de danos ao erário, mesmo quando as demais punições já estivessem prescritas. Conforme a tese firmada, é plenamente possível a continuidade da ação com esse fim específico, dado o caráter imprescritível da pretensão de ressarcimento.

Ademais, em outubro, o Plenário do STF julgou o ARE 875.958, fixando, por unanimidade, a tese de que o aumento da alíquota da contribuição previdenciária do servidor público de 11% para 13,25% não afronta os princípios da razoabilidade e da vedação ao confisco.

O caso tratava de lei complementar do estado de Goiás (LCE nº 100/12) que havia alterado as regras do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), mediante aumento da alíquota de contribuição e da cota patronal. Reconhecida a repercussão geral (Tema 933), foi firmado o entendimento de que a ausência de estudo atuarial específico e prévio à edição de lei que aumente a contribuição previdenciária não implica vício de inconstitucionalidade, mas mera irregularidade que pode ser sanada pela demonstração do déficit financeiro ou atuarial.

Por último, vale destacar o julgamento do RMS nº 66.823, em que se discutia o direito do servidor à remoção para acompanhamento de cônjuge. No caso, os servidores viviam em união estável registrada em cartório e trabalhavam em locais distintos. O servidor, policial militar, foi removido por interesse da Administração Pública. Ao requerer remoção para acompanhá-lo, sua companheira, policial civil, foi surpreendida com a negativa do delegado-geral da Polícia Judiciária do estado do Mato Grosso.

Ao apreciar o caso, o STJ salientou que a união estável é entidade familiar, nos termos do artigo 226, §3º, da Constituição, razão pela qual merece a mesma proteção estatal conferida ao matrimônio. Destacou, ainda, que o fato de os servidores trabalharem em locais distintos não constitui óbice ao direito à remoção. Com esses fundamentos, deu provimento ao recurso interposto pelo casal.

O retrospecto não é exaustivo e nem poderia ser. Afinal, as novidades são uma constante. Ainda assim, é sempre útil relembrar aspectos que auxiliam a melhoria da prática jurídica.