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É cabível o ajuizamento de revisão criminal contra decisões monocráticas de relator que restabeleçam a condenação. Essa possibilidade confere maior garantia aos réus em processo penal, assegurando-lhes o exercício de um direito que a lei não restringe.

Com esse entendimento e por maioria de votos, a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu permitir o trâmite de uma revisão criminal ajuizada contra decisão monocrática do ministro Felix Fischer, que restabeleceu a condenação do réu.

 

A posição foi alcançada por maioria de votos e pacifica um tema de grande relevância na seara criminal. Até então, havia uma dispersão jurisprudencial: alguns ministros julgavam incabível a revisão contra monocrática de relator; outros, cabível apenas quando enfrentado o mérito.

 

No caso, o réu teve a condenação por estupro de vulnerável restabelecida por decisão do ministro Felix Fischer em recurso especial do Ministério Público. A defesa interpôs agravo regimental, que não foi conhecido por sua intempestividade — foi ajuizado após o prazo legal.

 

Restou recorrer à revisão criminal, ação prevista no artigo 621 do Código de Processo Penal e possível quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei ou à evidência dos autos; quando se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; ou quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência ou de causa de diminuição especial da pena.

 

Antes que qualquer desses pontos pudesse ser argumentado ao STJ, o relator, desembargador convocado Olindo Menezes, julgou o processo incabível, pois a tese alvo do pedido de revisão não foi debatida colegiadamente.

 

Essa jurisprudência se baseia no artigo 239 do Regimento Interno do STJ, segundo o qual “à Corte Especial caberá a revisão de decisões criminais que tiver proferido, e à Seção, das decisões suas e das Turmas”. Ou seja, a previsão envolve apenas decisões colegiadas.

 

O relator aplicou a jurisprudência monocraticamente e a manteve na 3ª Seção. Ficou vencido, ao ser acompanhado pelos ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz e Antonio Saldanha Palheiro.

Substitutivo de acórdão

Abriu a divergência vencedora o ministro João Otávio de Noronha, que propôs a reflexão e pacificação do tema. A posição se baseia na razão de existirem as decisões monocráticas no Superior Tribunal de Justiça.

 

Elas se tornaram possíveis a partir de 1995, com alterações no Código de Processo Civil com o objetivo de desobstruir as pautas de julgamento, desde há muito sobrecarregadas. Monocraticamente, o relator passou a poder adiantar a posição colegiada, em temas de jurisprudência pacífica.

 

Essa orientação foi mantida sob o CPC de 2015 e cristalizada na Súmula 568 do STJ: “O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.”

 

Se a monocrática substitui o julgamento colegiado, não há motivos para impedir que possam ser atacadas por revisão criminal. Principalmente porque o Código de Processo Penal não prevê qualquer restrição nesse sentido.

 

Segundo o ministro Noronha, impedir a revisão criminal de monocráticas confere imutabilidade à decisão unipessoal de relator, cria uma categoria de decisões condenatórias não suscetíveis de revisão criminal e obriga as partes a recorrer de forma automática e indiscriminada ao agravo regimental.

 

Além disso, vetar o uso da revisão criminal no caso significaria que nenhum tribunal teria competência para conhecer do instrumento, mesmo na hipótese de qualquer das condições previstas no artigo 621 do CPP — o que só poderia ser analisado com base na argumentação da defesa.

 

“A 3ª Seção não deve privilegiar a interpretação gramatical restritiva do RISTJ [Regimento Interno do STJ]. Essa interpretação literal materializa, em verdade, o entendimento de que decisões monocráticas não representam o órgão colegiado, conclusão com a qual não se pode concordar”, apontou o ministro Noronha.

 

Formaram a maioria com ele os ministros Laurita Vaz, Jorge Mussi, Ribeiro Dantas e Reynaldo Soares da Fonseca — este, presidente da 3ª Seção e que só votou para desempatar o julgamento.