Esse foi o entendimento da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que considerou que não é possível aplicar o princípio da proporcionalidade para desclassificar o crime de estupro de vulnerável para o delito de importunação sexual.
A Seção analisou quatro recursos especiais (dois recursos de Minas Gerais e dois de Santa Catarina). Os casos tratam de menores de 14 anos que foram vítimas de crime sexual cometido por adulto, como perturbação, molestamento ou carícias indevidas. Julgados, os réus foram condenados pelo delito de importunação sexual, e não por estupro de vulnerável, em razão do princípio da proporcionalidade — o qual obriga o julgador a ponderar a gravidade da conduta.
Os Ministérios Públicos de Minas Gerais e de Santa Catarina recorreram. As promotorias pediram a reforma das decisões para que os réus respondam pelo crime de estupro de vulnerável, uma vez que menores de 14 anos são presumidamente vulneráveis — ou seja, incapazes de consentir.
Os promotores destacaram que a violência sexual sofrida por crianças e adolescentes em casos como os analisados, geralmente são a primeira experiência sexual que elas têm, o que pode causar danos físicos e psicológicos que acompanharão essas vítimas até o fim de suas vidas. Por fim, destacaram que é dever do Estado proteger a criança e o adolescente, física e psicologicamente, na sua integralidade.
A Defensoria Pública pediu a manutenção das decisões, alegando que o tipo penal “importunação sexual” é o enquadramento mais apropriado dado aos casos, já que tratam de situações em que não houve conjunção carnal. Destacou ainda que a aplicação do crime de importunação sexual para as situações menos ofensivas atende ao princípio da proporcionalidade, evitando que casos de “beijo roubado” ou “passada de mão” sejam enquadradas como estupro de vulnerável ou como contravenção penal de perturbação da tranquilidade.
Abuso infantil
O ministro Ribeiro Dantas foi o relator do caso. O ministro abriu seu voto destacando que medicina legal define como abuso sexual infantil toda e qualquer exploração do menor pelo adulto, que tenha por finalidade direta ou indireta a obtenção do prazer lascivo. Assim, “o adulto que explora um menor com a finalidade de obter prazer sexual direto ou indireto está a praticar atoa abusivo”.
O ministro demonstrou a preocupação na preservação da integridade das crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, pois, na maior parte das vezes, esses crimes ocorrem dentro de casa. “Uma parte considerável deste delito ocorre no interior dos lares que permanecem recobertos pelo silêncio das vítimas”, pontuou. Dantas ainda destacou a complexidade envolvida nos casos de violência infantojuvenil ocorrida dentro dos lares.
“Há uma elevada taxa de cifra negra nas estatísticas, além do natural medo de contar para os pais, quando estes não são os próprios agressores, não raro essas vítimas sequer possuem a compreensão adequada da anormalidade da situação vivenciada”, destacou.
No que se refere na necessidade de conjunção carnal para configurar crime de estupro, o relator lembrou que a violação pode se dar através de objetos, logo, a alegação da defesa não deveria ser acolhida.
O relator concluiu que não se deve tolerar os atos libidinosos contra menores de 14 anos, por mais rápidos que possam ser.