Com esse entendimento, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça fixou tese em recursos repetitivos sobre o tema, em julgamento na quarta-feira (9/3). A posição terá observância obrigatória pelas instâncias ordinárias.
No âmbito das turmas de Direito Privado da corte, não havia divergência sobre o tema. A afetação se deu porque, nos tribunais brasileiros, esse consenso não existia, o que continuava a gerar recursos.
A discussão envolve a incidência do limite de 30% para desconto de empréstimos comuns em conta salário, tal como definido pela Lei 10.820/2003, que trata especificamente da hipótese do empréstimo consignado.
A tese firmada foi: “São lícitos os descontos de parcela de empréstimo bancários comuns em conta corrente, ainda que utilizada para recebimento de salário, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto essa autorização perdurar, não sendo aplicável por analogia a limitação prevista no parágrafo 1º do artigo 1º da Lei 10.820, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento.”
Empréstimo comum x consignado
Relator, o ministro Marco Aurélio Bellizze explicou que a limitação se justifica porque, no caso do consignado, o desconto atinge diretamente o salário do trabalhador registrado, que não tem a opção de revogar essa forma de pagamento. O dinheiro descontado sequer entra na conta.
Assim, limitar o desconto a 30% do valor dos vencimentos é uma forma de evitar que isso comprometa a própria subsistência do trabalhador.
Esse não é um problema para o caso do empréstimo comum, no qual o mutuário faz a deliberada escolha de autorizar o desconto do valor da parcela diretamente de sua conta corrente. É uma forma, inclusive, de facilitar o pagamento.
Nesse caso, não há como individualizar de onde o valor está sendo descontado — se do valor recebido como salário ou do montante que já estava na conta. O mutuário tem livre acesso ao que recebe e inclusive pode cancelar a qualquer momento essa forma de pagamento, desde que arque com as consequências contratuais.
Efeitos colaterais
Para o ministro Bellizze, não cabe ao Judiciário restringir os descontos de empréstimos bancários comuns em conta corrente.
Por um lado, a medida geraria amortização negativa de débito, com aumento mensal e exponencial do saldo devedor, sem a devida conscientização do devedor a respeito do crédito responsável. Caberia ao mutuário não assumir compromisso financeiro que exceda sua capacidade financeira.
Por outro lado, retiraria das instituições financeiras a posição de não estimular dos clientes o endividamento imprudente. O efeito colateral seria o encarecimento e a restrição do crédito no Brasil.
“A prevenção e combate ao superendividamento, com vistas ao mínimo existencial do mutuário, não se dão por meio de indevida intervenção judicial dos contratos, em substituição ao legislador”, afirmou o ministro Bellizze.