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A condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais à vítima do crime ou seus familiares só é possível se houver pedido expresso na petição acusatória e indicação do valor mínimo pretendido para reparação.
Essa é a posição definida pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. Os requisitos processuais para a imposição da condenação a indenização por danos morais no processo penal vinham causando divergência de entendimentos.
A razão disso é o tratamento que o tema recebeu no Código de Processo Penal. O artigo 387, inciso IV genericamente diz que o juiz, ao prolatar a sentença, fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido.
Como não há requisitos nem diferenciação entre os danos morais e materiais — sendo estes de valor facilmente aferível —, parte do Judiciário adotou a posição mais ampla de permitir ao juiz da causa o cálculo completo do montante a ser pago pelo réu à vítima ou seus familiares.
A corrente que venceu a questão no STJ, por outro lado, resolveu emprestar do Código de Processo Civil os conceitos para resolver a questão. Isso é possível porque o CPC pode ser usado para suplementar a lei processual penal, como admite o artigo 3º do CPP.
Qual é o valor?
Relator no STJ, o ministro Ribeiro Dantas destacou que a legislação processual civil tem buscado aprimorar garantia do contraditório e da ampla defesa, impondo requisitos mais rigorosos para que magistrados resolvam as questões sob sua competência a partir de debates profissionais.
Na seara civil, mesmo nas causas em que o dano moral é presumido, o artigo 292, inciso V do CPC exige que a petição inicial seja apresentada com o valor pretendido. Isso permite à defesa exercer o contraditório e contestar de maneira qualificada o pedido, o que gera decisões mais fundamentadas.
Para o ministro Ribeiro Dantas, essa linha deve ser adotada também nos casos de indenização por danos morais no processo penal, inclusive diante das recentes alterações legislativas como o pacote “anticrime”, que deram uma guinada de um sistema penal inquisitório para acusatório.
A consequência é que a atuação de ofício do juiz é desencorajada. Logo, não cabe a ele definir as bases em que se deve discutir o valor do dano moral causado por um crime. “Como juiz vai dar algo que sequer foi pedido?”, indagou o ministro Ribeiro Dantas.
Seu voto acrescenta ainda que a indicação de um valor mínimo na inicial acusatória não vincula o juiz. “É mais um indicativo que ele deve considerar como parte das informações relevantes que tem à disposição, ao determinar valor da condenação.”
Dano presumido
Formaram a maioria Joel Ilan Paciornik, Sebastião Reis Júnior, Reynaldo Soares da Fonseca, Jesuíno Rissato e João Batista Moreira. “Não é possível que, para uma condenação na seara penal, se exija menos que na seara cível”, apontou Rissato.
No caso concreto, a posição serviu para derrubar a possibilidade de a vítima de crime de estelionato obter a reparação por danos morais no processo penal. A acusação não indicou valor mínimo ao apresentar a denúncia contra o réu.
A mulher alvo do estelionatário só soube do crime quando tentou fazer uma compra e teve o cheque recusado por estar com o nome negativado em instituições de proteção ao crédito, graças aos prejuízos financeiros causados pelo ato ilícito.
Assim, o dano moral seria presumido. Isso dispensaria a abertura de uma instrução probatória específica.
Não precisa pedir
Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Messod Azulay, acompanhado por Rogerio Schietti. Para eles, tais requisitos formais são dispensáveis porque não constam na lei. Não há regra no CPP que imponha a apresentação de valor mínimo na inicial acusatória.
“Nem sempre o Ministério Público ou o querelante tem condição de estimar valor do dano moral. E esse instituto do dano moral é um só na esfera cível ou criminal. Na maior parte das vezes, o valor só pode ser aferido ao final da instrução ou até mesmo finalizado processo criminal”, pontuou Azulay.
Em sua análise, exigir a indicação do valor representa formalismo exacerbado que, se dispensado, não viola os princípios do contraditório ou da ampla defesa. Em vez disso, acaba por beneficiar indevidamente o infrator, em prejuízo da vitima.
Rogerio Schietti concordou, em meio a críticas pela “processualização civil” do processo penal. Ele entende que as especifidades da ação criminal não permitem transferir a obrigação civil de informar valor de reparação na petição inicial.
A principal delas reside no fato de que a reparação por danos morais, em regra, será pedida pelo Ministério Público em favor de terceiros. O CPP, por sua vez, meramente determina que o juiz, ao julgar a causa, fixe valor mínimo para reparação de danos.
“E que quantum seria esse? O dano moral no caso de um crime patrimonial é algo muito poroso. Se juiz não puder depreender da instrução probatória qualquer tipo de lesão moral, ele não arbitrará valor”, afirmou o ministro Schietti.
REsp 1.986.672