Migalhas
Nesta quarta-feira, 4, STF, por maioria, decidiu que pessoa com os direitos políticos suspensos em razão de condenação criminal definitiva pode tomar posse em cargo público. Plenário também determinou que não pode haver incompatibilidade entre o cargo a ser exercido e o crime cometido, nem conflito de horários entre a jornada de trabalho e o regime de cumprimento da pena.
Os ministros fixaram a seguinte tese:
“A suspensão dos direitos políticos prevista no art. 15 inciso III da Constituição Federal – condenação criminal transitada em julgado enquanto durarem seus efeitos – não impede a nomeação e posse de candidato aprovado em concurso público, desde que não incompatível com a infração penal praticada, em respeito aos princípios da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho (Constituição Federal, art. 1°, incisos III e IV) e do dever do Estado em proporcionar as condições necessárias para harmônica integração social do condenado, objetivo principal da execução penal, nos termos do artigo 1° da LEP (Lei 7.210/84). O início do efetivo exercício do cargo ficará condicionado ao regime da pena ou à decisão judicial do Juízo de Execuções, que analisará a compatibilidade de horários.”
O caso
No caso concreto, um candidato aprovado em concurso para o cargo de auxiliar de indigenismo da Funai busca o direito de participar do curso de formação. Condenado à pena privativa de liberdade por tráfico de drogas, ele foi impedido de tomar posse, por estar com seus direitos políticos suspensos.
O TRF da 1ª região deu provimento à apelação do candidato, por entender que a execução penal também tem por objetivo proporcionar condições para a integração social do condenado. Como ele estava em liberdade condicional, o Tribunal não considerou razoável impedir seu acesso ao cargo, assentando que a responsabilidade pela ressocialização dos presos também se estende à administração pública, que não poderá opor o impedimento da quitação com as obrigações eleitorais ao candidato aprovado e convocado.
No STF, a Funai sustenta que as regras do concurso público existem para todos e não podem ser afastadas, sob pena de violação dos princípios constitucionais da isonomia e da legalidade. A fundação argumenta que o texto constitucional é claro ao determinar a suspensão dos direitos políticos enquanto durarem os efeitos da condenação, que são mantidos, ainda que o apenado esteja em liberdade condicional.
Voto do relator
Ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, inicialmente, explicou que a condenação afasta tanto da capacidade eleitoral ativa (votar) quanto a capacidade eleitoral passiva (ser votado). Assim, em seu entendimento, como a capacidade eleitoral ativa é uma consequência automática aos condenados, não é possível negar ao candidato a posse do cargo por débito com as obrigações eleitorais.
“Se ele está impedido de votar pela condenação, obviamente aqui ele não pode sofrer um duplo prejuízo.”
Em seguida, S. Exa. explicou que a suspensão dos direitos políticos em caso de condenação criminal não atinge direitos civis e sociais. “O que a Constituição Federal estabelece é a suspensão do direito de votar e de ser votado, e não do direito a trabalhar.”
Por fim, o relator citou a importância do trabalho para a ressocialização do indivíduo egresso do sistema prisional.
No caso concreto, Moraes votou no sentido de negar provimento ao recurso extraordinário, devendo ser dada a posse imediata ao candidato no cargo.
Ao acompanhar o relator, a ministra Cármen Lúcia relembrou o projeto “Começar de Novo”, implantado no Supremo durante a gestão do ministro Gilmar Mendes. “Nós contratamos pessoas que tenham saído [do sistema prisional], e não significa que já completaram todo ciclo de execução penal, exatamente para que se cumpra a finalidade da própria Constituição na ressocialização”, disse. S. Exa.
“O egresso do sistema prisional que assume responsabilidade e cumpre os seus deveres civis faz jus à manutenção dos direitos mais básicos do cidadão. Se é esperado que um indivíduo se reintegre a sociedade, deve o Estado prover os meios para tanto”, afirmou o ministro André Mendonça ao seguir a vertente apresentada por Moraes.
Os ministros Luis Fux, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso também acompanharam o relator.
Divergência
Restaram vencidos os ministros Cristiano Zanin e Dias Toffoli. Para os ministros, “a condenação criminal transitada em julgado enquanto durarem os seus efeitos suspende o gozo de direitos políticos, impedindo a investidura em cargo público”.
Ministro Nunes Marques não participou do julgamento porque havia atuado no caso como desembargador do TRF da 1ª região.
Processo: RE 1.282.553